O que fazem os militares russos em Moçambique?
Por: José Milhazes
Não obstante os
desmentidos de Moscovo e Maputo, é verdade que ao Norte de Moçambique chegaram
cerca de 160 militares russos, acompanhados de material bélico e logístico. Os
objectivos finais desta operação são a criação de uma base móvel de tropas da
GRU (Direcção Principal de Reconhecimento, serviços secretos militares russos)
e de uma base naval russa permanente nesse país lusófono. O Presidente da
Rússia, Vladimir Putin, tem prestado cada vez maior atenção ao continente
africano, ao ponto de convocar uma cimeira Rússia-África para a cidade de
Sochi, no próximo mês de Outubro.
As causas para o
“regresso a África” são várias. Depois da passagem inglória da União Soviética
por esse continente, que pouco mais fazia do que fornecer armas e conselheiros
militares a movimentos que se afirmassem ser “anti-imperialistas”, Putin quer
voltar ao continente com o objectivo de pelo menos retirar dividendos
económicos. Ele procura mercados alternativos que permitam suavizar o impacto
das sanções ocidentais contra o seu país depois da anexação da Crimeia em 2014.
Além disso,
Moscovo, não tendo capacidade para oferecer altas tecnologias, investe na extracção
de matérias-primas, onde tem grande experiência: gás, petróleo, ouro,
diamantes, bauxites, etc. Desse modo, os dirigentes russos tentam resolver
simultaneamente dois problemas: compensar as dificuldades cada vez maiores que
enfrenta a extracção de matérias-primas no seu próprio país, ao ser feita em
locais mais frios e de mais difícil acesso, e continuar a ter forte influência
nos mercados internacionais de hidrocarbonetos, a principal fonte de receitas
do orçamento russo.
Nos últimos anos,
empresas russas têm-se afirmado em países do continente africano como Sudão do
Norte, Líbia, República Centro-Africana e Zimbabué. Agora, parece ter chegado a
vez de Moçambique.
O Presidente
moçambicano, Filipe Nyusi, estava convidado para a Cimeira de Sochi, mas antecipou
a sua viagem à Rússia para Agosto, pois, em Outubro, estará envolvido nas
eleições gerais marcadas para 15 de Outubro.
Durante essa
visita, foram assinados numerosos acordos bilaterais de cooperação, mas para o
caso interessa o seguinte: os ministros da Defesa de Moçambique e da
Rússia: Atanásio M’tumuke e Serguei Choigu, acordaram a “protecção da
informação confidencial” nas relações bilaterais. Além disso, o Governo
moçambicano aprovou o regime simplificado de entrada de navios militares da Marinha
da Rússia em portos moçambicanos, coisa que já acontecia na era da cooperação
estreita entre a Frelimo e o Partido Comunista da União Soviética.
Estes passos
visam a criação de uma base militar russa no Norte de Moçambique. Coincidência
ou não, nos últimos tempos têm-se registados ataques de grupos armados
desconhecidos contra a população na Província de Cabo Delgado e os militares
russos poderão ajudar no combate, “tal como fazem na Síria contra os
extremistas islâmicos”. Além disso, há já acordos assinados entre empresas
russas e Moçambique sobre a prospecção e exploração de jazidas de gás na
região, que necessitam de proteção.
Os países são
entidades soberanas e podem assinar os acordos que acharem mais convenientes
aos seus interesses, mas Moçambique só desenvolver~se e prosperar se a sua
elite política e económica sair do pântano da corrupção e utilizar a
cooperação internacional para alcançar
esses objectivos, e não para enriquecimento pessoal.
in: Observador.pt
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