Dívidas ocultas: Primeiro contacto foi com agente secreto sul-africano
Afinal, terá sido uma agente secreta sul-africana quem apresentou Jean
Boustani aos moçambicanos. A revelação foi feita ontem na primeira pessoa pelo
próprio executivo libanês da Privinvest, quem afirmou que além de Moçambique, a
companhia de produção de barcos propôs projectos de protecção costeira e
desenvolvimento de economia azul a Namíbia, Quênia, Tanzânia e Nigéria.
Basetsana
Thokoane terá sido quem propôs a Jean Boustani que buscasse oportunidades de
investimento em Moçambique devido a descoberta de recursos naturais. Segundo
revelou o libanês no Tribunal Federal Distrital de Brooklyn, nos Estados
Unidos, a suposta agente secreta disse que conhecia pessoas seniores em
Moçambique e que poderia ajudar a fazer corredores para implementação. A rede
terá sido assim: Basetsana Thokoane conhecia Rosário Mutota, antigo agente do
Serviço de Informação e Segurança do Estado e "parceiro de negócios"
de Teófilo Nhangumele. Em 2011, Jean Boustani viaja para Moçambique onde na
companhia de Nhangumele participa de uma reunião acolhida pelo Ministério da
Ciência e Tecnologia, onde conheceu o então ministro Venâncio Massinga, que lhe
fez "uma apresentação sobre as oportunidades em Moçambique".
O nome da suposta
agente secreta da África do Sul foi encontrado em um email interceptado pelo
FBI, onde Boustani promete pagá-la seis milhões de dólares. No email enviado
por Boustani para Thokoane lê-se:
“Para o teu
conhecimento. Para os frangos, vou adicionar 62 milhões no total (12 milhões
para ti e para mim – equivalentes a 5 por cento porque o valor que colocamos
são 240 milhões). O que o leitor vai acompanhar a seguir são transcrições das
respostas de Jean Boustani as perguntas do seu advogado Michael Schachter.
Gostaria de
chamar sua atenção para 2010, no momento em que procurava oportunidades para
apresentar propostas de projectos costeiros em África. Quem o aproxima dessas
oportunidades?
Pelo que me
lembro, como eu disse chamamo-los de agentes ou arranjadores de negócios. Era
uma senhora nossa amiga da África do Sul, chamada Basetsana Thokoane.
E o que você
sabia sobre o histórico da senhorita Thokoane antes de se tornar uma agente ou
lobista?
A senhorita
Thokoane chamo-a Bassy, era oficial do Serviço Secreto da África do Sul.
Você mencionou
que tinha trabalhado com agentes ou lobistas antes de juntar-se a Privinvest.
Também veio à Privinvest trabalhar com lobistas?
Sim. No Oriente
Médio e em África, a menos que conheça pessoalmente os decisores, você precisa
de um agente ou lobista para organizar as possibilidades de aprovação de
projectos financeiros, especialmente na área de defesa.
É habitual que
esses agentes ou lobistas sejam pagos por ajudar o investidor privado a
encontrar projetos?
O modelo de
negócios de um agente é muito simples. O agente lhe dirá o seguinte: farei o
meu melhor para garantir o projecto para você e, consequentemente, você
garantirá uma percentagem do valor do projecto.
E como é
chamada essa percentagem do projecto?
Comissão.
Comissão.
Pode nos
explicar como começou a trabalhar com a senhorita Tokhoane, desde 2010.
A Bassy
abordou-me sobre muitas oportunidades em África. Especificamente a primeira
oportunidade foi na Namíbia. Lembro também de oportunidades no Quênia,
Tanzânia, Nigéria e depois Moçambique.
Thokoane mencionou
em algum momento que Moçambique também estava a procura de ajuda no
desenvolvimento do sistema de monitoria costeira?
Moçambique é um
país fronteiriço no sul de África, de onde ela vem. Eles (sul-africanos e
moçambicanos) compartilham muitas histórias comuns, por isso são muito próximos
politicamente. Então ela disse-me que por ter tido um relacionamento especial
com moçambicanos durante o apartheid, onde os sul-africanos refugiavam-se em
Moçambique e as vezes na Tanzânia, ela conheceu muitas pessoas seniores em
Moçambique. Ela disse: o país está descobrindo muitas reservas de gás vamos ver
o que podemos fazer.
E quem te
apresentou ao Senhor Teofilo Nhangumele?
Bassy (Basetsana Thokoane)
Bassy (Basetsana Thokoane)
E o que ela
disse sobre ele?
Ela trabalhava
nos serviços secretos e costumava conhecer outros oficiais moçambicanas do
serviço secreto. O homem que ela conhecia tinha uma empresa ou parceria com o
Sr. Nhangumele. Ela não conhecia o Sr. Nhangumele, inicialmente conhecia muito
bem o parceiro dele desde os tempos da guerra.
Vamos olhar
para 2011 quando você viaja para Moçambique.
Encontrei-me com
o Sr. Nhangumele e seu parceiro, o nome dele é o Rosário Mutota. Houve uma
reunião preparada no Ministério da Ciência e Tecnologia com o ministro. Penso
que eles pediram que ele (o ministro) fosse o ponto focal para apresentar as
oportunidades de Moçambique aos investidores estrangeiros. Falaram de várias
oportunidades de investimentos e eu falei dos projectos da Privinvest.
O que você
achou do Sr. Nhangumele?
Muito educado,
muito inteligente, profissional. Um bom homem.
A primeira parte do depoimento terminou assim e continua hoje.
A primeira parte do depoimento terminou assim e continua hoje.
Detido numa
prisão de Brooklyn, nos Estados Unidos, desde 02 de janeiro, Jean Boustani
voltou a declarar-se inocente de dois crimes de que é acusado: conspiração para
cometer fraude e conspiração para cometer lavagem de dinheiro.
*Título do Blog
O PAÍS – 19.11.2019
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