PR e ex-ministro moçambicanos receberam dinheiro para campanhas, segundo o arguido


O principal arguido de um caso de corrupção, em julgamento nos Estados Unidos, afirmou na quarta-feira que o Presidente de Moçambique e um antigo ministro das Finanças do país receberam milhões de dólares para campanhas eleitorais.
O negociador da empresa Privinvest, acusada de subornar governantes e políticos, Jean Boustani disse que a companhia pagou quatro milhões de dólares para o partido Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) para “apoiar a campanha presidencial” do Presidente Filipe Nyusi, em 2014.
Mas o arguido, que enfrenta acusações de fraude económica, fraude de valores mobiliários, suborno de membros do governo e branqueamento de capitais, declarou que nenhum pagamento foi “um suborno” relacionado com os projetos das empresas moçambicanas Ematum, MAM ou Proindicus que, entre 2013 e 2016, assumiram empréstimos internacionais à revelia do Governo de Moçambique e causaram uma “dívida oculta” de 2,2 mil milhões de dólares.
Além da contribuição para a campanha presidencial de Nyusi, a Privinvest também contribuiu com cinco milhões de dólares para a “campanha para o parlamento” do antigo ministro das Finanças moçambicano Manuel Chang.
Jean Boustani prestou depoimento sobre as acusações de subornos pagos pela empresa Privinvest a membros do Governo e autoridades de Moçambique, como Manuel Chang, António do Rosário, Isaltina Lucas, Renato Matusse e outros, durante o qual negou que se tratassem “de subornos”, e considerou serem apoios a “negócios privados” ou a “planos pessoais”.
A explicação começou por uma reunião na sede da empresa Privinvest em Abu Dhabi, em 2014, onde estavam presentes o fundador e presidente executivo, Iskandar Safa, e o responsável de vendas, Jean Boustani.
“Acho que era em maio de 2014, por essa altura já sabíamos qual era a dimensão dos projetos em Moçambique. Era, também, a campanha do futuro Presidente Filipe Nyusi, para a qual contribuímos”, indicou Jean Boustani, antes de ser interrompido pelo advogado Michael Schachter.
Mais adiante no depoimento, a Defesa mostrou um ‘e-mail’ de Jean Boustani para o diretor financeiro da empresa Privinvest de acordo com o qual uma entidade “A” devia receber quatro milhões de dólares.
Aquele valor referia-se “especificamente (…) no período de tempo da campanha do partido pelo futuro Presidente Nyusi. Estes quatro milhões foram uma contribuição para o partido Frelimo pela campanha nas eleições presidenciais”, explicou Jean Boustani em tribunal.
O advogado de Boustani perguntou se o antigo ministro das Finanças Manuel Chang “tinha falado dos seus planos”, numa das visitas da delegação moçambicana às instalações da Privinvest em França e na Alemanha.
Jean Boustani disse que Manuel Chang respondeu, em confidência, “estar cansado” de cargos políticos e que pensava em abrir um banco.
“Quando forem as eleições para o Presidente Nyusi, ele [Manuel Chang] disse não acreditar que ia continuar a ser ministro das Finanças, por estar cansado e estar a fazer isso há quase duas décadas”, relatou Jean Boustani, em tribunal.
De acordo com o negociador da Privinvest, Chang disse que “tinha vários negócios, tinha uma empresa de consultoria e estava a planear abrir um banco” e “anunciou que queria concorrer para ser membro do parlamento ou congressista”.
Segundo o depoimento, Manuel Chang perguntou se havia interesse “em financiamento” ao que Iskandar Safa concordou e disse que “podia dar apoio para a campanha parlamentar”.
“Perguntámos quanto ele estimava os custos para a campanha e para a licença do banco (…), ele disse que cinco milhões (…) eram suficientes para iniciar o processo”, afirmou Jean Boustani.
Foi assim que Jean Boustani mandou um comprovativo de transferência para uma entidade, a Thyse International Incorportation, no valor de cinco milhões de dólares, numa altura em que Manuel Chang tinha aprovado o empréstimo para a Proindicus há oito meses. O projeto foi assinado em fevereiro e a transferência foi efetuada em outubro.
Para a empresa Privinvest, as transferências de dinheiro intercetadas pela Procuradoria dos Estados Unidos eram para “influência e lóbi”, disse Boustani, citando o Presidente da empresa, o bilionário Iskandar Safa.
Os pagamentos faziam partes de “um orçamento” criado por Iskandar Safa para “diferentes atividades, investimentos, construção de relações, ‘lobbying’ e influência, disse o arguido. “Tudo o que queríamos construir para o longo futuro de Moçambique”, acrescentou.
Manuel Chang, detido na África do Sul, enfrenta dois mandados de extradição para os Estados Unidos e para Moçambique, por envolvimento no esquema de subornos.
O caso está a ser investigado nos Estados Unidos porque algumas transferências bancárias de alegados “subornos” terão passado por bancos intermediários em Nova Iorque e porque investidores norte-americanos sofreram grandes perdas com os investimentos em Moçambique.
LUSA – 21.11.2019

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