Camarada Nelinho – o protegido!


Por Edwin Hounnou

A peça teatral ensaiada pelo empresário Manuel Rodrigues Ramissane, mais conhecido por Nelinho que foi presidente da Assembleia Provincial na legislatura passada, deputado da Assembleia da República pela Frelimo -, no dia 05 deste Junho, sexta-feira por volta das 19.30 horas, na Beira, de tentar implicar os jornalistas Arsênio Sebastião, correspondente da Voz da Alemanha (DW) e de Jorge Malangaze, freelance, no crime de corrupção passiva, é repugnante e ridícula. A lógica manda dizer que não pode haver agente passivo sem o activo. Quem é o agente activo e porquê não foi, também, detido?

Os dois jornalistas foram alertados de que, no complexo Monte Verde estava a decorrer uma festa com um pouco mais 100 pessoas. Eles lá se fizeram ao local. Viram que era uma festa que só podia fazer recordar outros tempos. A realização dessa festa violava o decreto presidencial que proíbe festas e outros grandes aglomerados de indivíduos, seja em que circunstancias forem, devido à pandemia de coronavírus que está a assolar o país, a região e todo o planeta. Há quem esteja acima da lei e Nelinho é um deles.

Chegados ao local onde decorria a festa, os jornalistas tiraram fotografias e filmaram toda a cena dos convivas que dançavam e se abraçavam como se nada de anormal estivesse a acontecer. Para que não houvesse dúvidas sobre a violação do decreto presidencial que a todos pretende defender, procuraram pelo dono do complexo a fim de fazer o contraditório, para tornar a notícia credibilidade. Nelinho pediu aos jornalistas que voltassem na segunda-feira , dia 08, para fazerem o contraditório requerido. 

No dia combinado, os dois repórteres se fizeram ao Monte Verde e a primeira coisa que Nelinho foi convidá-los para se sentarem  à mesa e almoçarem por conta da casa. Os jornalistas declinaram essa aparente amabilidade em papel de corrupção, respondendo-lhe que já tinham  acabado de almoçar. Insistiram eles dizendo que pretendiam, tão-somente, perceber a razão de tanta aglomeração de gente, sexta-feira anterior, violando o decreto presidencial que proíbe ajuntamento de pessoas em tempo de quarentena. 

Vendo Nelinho gorados os seus intentos de corromper os jornalistas, largou dinheiro - 5.000,00 meticais -, sobre a mesa onde estavam os jornalistas. Nesse instante, uma senhora, que se encontrava numa mesa próxima com os ouvidos virados para a conversa que Nelinho ia travando com os jornalistas, apareceu como que da cartola e exibiu o cartão que a identificava como procuradora do Gabinete da Anti-Corrupção e disse aos repórteres que estavam presos por corrupção passiva, enquanto outros polícias iam aparecendo, um a um, a cercá-los e a retirar-lhes os seus instrumentos de trabalho. 

O dinheiro desembolsado por Nelinho não estavam nas mãos de nenhum dos dois jornalistas, porém, sobre a mesa e no lugar onde havia sido largado. Não custa concluir que Nelinho armou a cilada em conluio com indivíduos corruptos que integram o Gabinete da Anti-Corrupção, numa tentativa de abafar o escândalo de desobediência ao decreto presidencial protagonizado por aquele “alto" quadro Frelimo, fazendo -se por vítima dos jornalistas, supostamente, corruptos que o tentaram, sem sucesso, extorquir dinheiro. 

Há motivos bastantes para se dizer que Nelinho, feito de espertinho, correu e correu tanto que se foi esconder na primeira esquina que encontrou tendo deixado  o rabo de fora. Quem é, afinal, o corrupto? – Aqui não  precisamos da Anticorrupção nem de nenhum outro especialista qualquer para apontarmos o dedo ao corrupto. 

Atitudes similares à de Nelinho já levaram pessoas à cadeia e submetidos. Vemos, em todas as províncias,  a polícia a recolher pessoas encontradas a celebrar aniversários de amigos num canto de um restaurante da cidade. Em Maputo um grupo de funcionários públicos juntaram-se numa creche para se despedirem da sua chefe que ia passar à reforma, mas surpreendidos pela polícia e, segundo informações do Parlamento ao Governo, decorrem os trâmites legais para responsabilização de todos que estiveram na festa. Na Beira, agentes da polícia tiraram a vida de um cidadão encontrado num campo de futebol de bairro, por aglomerar pessoas em tempo de pandemia de coronavírus. 

Adolescentes encontrados, na cidade de Nampula, a passear e outros a vender qualquer coisa para “matar" a fome lá em casa, foram recolhidos à polícia e os pais foram buscar o seu menino, diz-se, que os pais tiveram que pagar algo por cada criança. Vimos, em Chimoio, mamanas foram jogadas nos carros da polícia por  permanecerem na  rua a vender, para além da hora de recolha. Com que linhas, se cose a polícia que até se voluntaria para cumprir ordens ilegais de uma procuradora eminentemente corrupta?

Os dois jornalistas permaneceram sob a custódia policial por ordens da tal procuradora do Gabinete da Anti-Corrupção, desde de 08  a 12, depois libertos por uma juíza de instrução criminal que concluiu não haver nenhum indício de crime. Há aqui dois casos a ter em conta. Nelinho deveria ser incriminado por violar o decreto presidencial e por simular corrupção, por parte dos jornalistas, que não existiu nem foi encontrada. A Procuradoria-Geral da República deveria ter já desencadeado para levar Nelinho ao banco dos réus como acontece com todos outros violadores da lei em vigor no país.

O Gabinete de Combate à Corrupção deveria processar a sua procuradora por se enrolar em esquema de corrupção. Os jornalistas manchados pelos mafiosos deveriam submeter queixa-crime à Procuradoria-Geral contra Nelinho e a procuradora que vendeu a alma, exigindo uma pesada indeminização pelos danos morais provocados. Não basta aos jornalistas entregarem as mãos de contentamento por se verem fora das prisões. É preciso exigir justiça para actos ilegais como esse para que não voltem a acontecer mais. Os malandros devem ser punidos de modo exemplar para voltarem a prejudicar a ninguém.

Congratulamos o MISA-Moçambique por ter acreditado na idoneidade e na inocência dos jornalistas, desmascarando os envolvidos na tentativa de desacreditar o trabalho dos dois repórteres. A luta para silenciar a imprensa independente vai continuar por se tratar da luta entre o  Mal contra e o Bem, por ser uma justa contra os corruptos e bandidos encapuzados de agentes do Estado e da Lei.

Na semana em que os dois jornalistas estavam sendo seviciados, na Beira, um artista do além – fronteira, chamado Nuno Rogerio, que se faz de expert em questões de Cabo Delgado, estava sendo ovacionado por molecadas do gabinete de propaganda do  Presidente Filipe Nyusi, por sofrer de amnesia, para desacreditar o Canal de Moçambique, por ser dos poucos jornais em que se acredita. Parecia uma acção coordenada para coartar a liberdade de imprensa e limitar a liberdade de expressão.

Não nos demoverão das nossas convicções. Defendemos  até à exaustão os interesses do nosso país. Não nos aliaremos aos corrompidos que se fazem acompanhar de agentes da polícia para darem um cunho legal aos seus crimes, como fez a procuradora da Anticorrupção que, de modo injusto e ilegal, mandou prender os jornalistas Arsênio Sebastião e Jorge Malangaze ao invés de prender Nelinho, por ser o prevaricador.

CANAL DE MOÇAMBIQUE – 24.06.2020


Comentários

Mensagens populares deste blogue

Dívidas ocultas: Primeiro contacto foi com agente secreto sul-africano

30 years of brutal silence of Germany on slavery of Mozambicans

Sobreviventes do massacre descrevem “execuções agoniantes” em campo de futebol de Muidumbe