Tribunal enquadra "críticas severas" a Armando Guebuza dentro da liberdade de expressão
O Tribunal de Recurso da Cidade de Maputo pronunciou-se sobre um artigo de opinião de 2013 contra o ex-Presidente moçambicano Armando Guebuza e concluiu que as "críticas severas" fazem parte do exercício da liberdade de expressão, lê-se no acórdão.
A decisão nega provimento a um recurso do Ministério Público, de 2015, e mantém a sentença de primeira instância, incluindo a ideia de as opiniões serem livres, por muito "embaraço ou desconforto" que criem por serem "críticas severas".
"A liberdade de expressão deve prevalecer sobre a pretensão da defesa da honra e consideração a bem da sociedade e do Estado de Direito Democrático", conclui o acórdão de quatro juízes desembargadores, datado de há uma semana, 10 de Julho, e hoje consultado pela Lusa.
O caso diz respeito a uma carta do economista Nuno Castel-Branco dirigida ao chefe de Estado da altura, Armando Guebuza, divulgada em Novembro de 2013 na rede social Facebook e reproduzida no jornal eletrónico Mediafax.
Entre outras críticas, o autor acusava o chefe de Estado de estar “fora do controlo” e de ter empurrado o país novamente para a guerra, numa alusão aos confrontos, na altura, entre as Forças de Defesa e Segurança e o braço armado da Renamo (Resistência Nacional Moçambicana), principal partido da oposição.
O Ministério Público acusou o autor de difamação, calúnia e injúria contra o Presidente da República e acusou Fernando Mbanze, editor do diário eletrónico Mediafax, do crime de abuso de liberdade de imprensa.
Em Setembro de 2015, o Tribunal Judicial do Distrito de Kampfumo, em Maputo, absolveu ambos, justificando-o com o direito à crítica pública.
O Ministério Público recorreu, considerando ser necessário encontrar "um ponto de equilíbrio", não se justificando "qualquer sacrifício do direito à honra e consideração, como se a liberdade de expressão e de pensamento e a liberdade de imprensa fossem direitos absolutos" face àquele.
Quase cinco anos depois chega o acórdão em que é negado provimento ao recurso e é confirmada a sentença de primeira instância "nos seus precisos termos".
Segundo o Tribunal de Recurso, é expectável que a actuação de um Presidente da República desperte "as mais diversas emoções de aprovação e reprovação, de amor profundo e ódio visceral. É fruto do ofício! É o peso da responsabilidade e do poder!".
Os juízes desembargadores sublinham que "a limitação do direito de expressão, sob o condão da tutela dos direitos pessoais de honra e bom nome, comprometeria o próprio Estado de Direito Democrático".
"O direito à livre expressão é um meio necessário à sua subsistência e ao controle da actividade política", concluem.
LUSA – 18.07.2020
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