Eleições em Moçambique: EU e EUA tentam agradar gregos e troianos
Esta eleição foi
diferente. Cobri todas as eleições multipartidárias em Moçambique e a Frelimo
sempre exigiu dos seus membros “victória a todo custo”. Mas estas parece que
são as primeiras eleições gerais em que a Frelimo exerceu poder de forma
organizada mas descentralizada.
Relatos de
observadores e dos nossos correspondentes, a partir das assembleias de voto, na
quarta-feira, mostraram novo ambiente de controlo, muito mesquinho. Os
presidentes de mesa insistiam que os observadores deviam manter-se de pé
(impedindo-os de sentar-se), ou porque não podiam permanecer nas assembleias de
voto por mais de 30 minutos ou mesmo recusavam-lhes o acesso às assembleias de
voto por alegadas irregularidades. Isto sucedeu depois das comissões
provinciais e distritais de eleições recusarem credenciar observadores
independentes e delegados de candidaturas de partidos concorrentes, enquanto
emitia milhares de credenciais para grupos de observadores nunca mais vistos
mas leais a Frelimo como o Conselho Nacional da Juventude (CNJ) e SIM - em alguns
casos sem sequer constar o nome dos observadores nas credenciais. Muitos destes
“observadores” são quadros locais da Frelimo e do Estado e nossos
correspondentes reportaram que os “observadores” davam instruções aos Membros
de Mesa de Voto (MMV). Os observadores e delegados de candidaturas que
questionavam alguns procedimentos no decurso da votação eram intimidados pelos
MMV’s, delegados de candidatura e pelos observadores ligados à Frelimo. Às
vezes parecia intimidação por um grupo de pessoas que já se conheciam um ao
outro. O presidente de mesa chamava a Polícia ou ameaçava chamar a Polícia para
intervir. Embora não tenha havido uma ameaça directa, para os observadores esta
era uma clara ameaça. Muitos observadores individuais ou delegados de candidaturas
de partidos da oposição sentiram-se muito intimidados para emitir qualquer
comentário ou levantar crítica. Este clima da coordenada observadores e
correspondentes em muitos lugares e foi algo novo que se vou nestas eleições. Esse
clima de controlo e intimidação criou espaço para má conduta em pequena escala
em grande nível do que o relatado no passado. A eleitores conhecidos da Frelimo
não era exigido mergulhar os dedos na tinta indelével nem sequer pintar a ponta
do dedo. Muitas pessoas foram surpreendidas com boletins de voto extras - e
efectivamente foram encontrados nas urnas vários boletins juntos dobrados
juntos durante a contagem, indiciando que foram introduzidos juntos dobrados.
Os observadores relataram situação generalizada de inobservância das regras
durante a contagem. Os editais de apuramento parcial não foram afixados à
entrada dos locais onde funcionaram as assembleias de voto, conforme exigido
por lei. Os MMV’s foram vistos a preencher editais do lado de fora da
assembleia de voto e até na traseira das viaturas que transportavam as urnas à
sede do distrito. Observadores comentaram o quão comum era ver sacos contendo
boletins de voto sem não selados. As operações eleitorais de Moçambique estão
agora totalmente politizadas. Por exigência da Renamo na última década, há
representação de partidos políticos com assento parlamentar em todas as
comissões eleitorais e no STAE a todos os níveis. A Renamo acreditava que tendo
mais pessoas nos órgãos eleitorais poderiam impedir a fraude. Mas não teve o
efeito desejado. Os assentos dos partido políticos nos órgãos eleitorais são
atribuídos proporcionalmente ao número de assentos no parlamento, e os assentos
da sociedade civil nos órgãos eleitorais são, na prática, concedidos a pessoas
de grupos da sociedade civil alinhadas a partidos, na mesma proporção. Isto dá
à Frelimo uma maioria em todas as comissões eleitorais. Nas eleições
anteriores, a Comissão Nacional de Eleições (CNE) tentou ser equilibrada e
relativamente neutra, mas nas eleições autárquicas do ano passado e nas
eleições gerais deste ano, a CNE votou de acordo com o alinhamento partidário.
Assim foi hierarquicamente: as comissões de eleições provinciais, distritais
bem como o STAE a todos níveis foram dominados pela Frelimo, e eles usaram seu
poder para recusar credenciais a observadores independentes e colocar as
pessoas da Frelimo nas assembleias de voto. Dois acontecimentos consolidaram
essa ideia de controlo e intimidação. Em Gaza, a CNE e STAE recensearam mais de
300.000 eleitores do que a população adulta em idade eleitoral, de acordo com o
censo da população de 2017. Quando o presidente do Instituto Nacional de
Estatística recusou-se a falsificar os resultados do censo para coincidir com o
recenseamento, ele foi forçado a renunciar por Filipe Nyusi, presidente
República da Frelimo. Era uma mensagem clara do controlo da Frelimo. Dez dias
antes da votação, um esquadrão da morte da Polícia da elite matou o chefe da
observação eleitoral da sociedade civil independente em Gaza, numa rua de
Xai-Xai, em plena luz do dia. Era uma mensagem clara de intimidação à
observação independente. A Frelimo sempre foi muito descentralizada. A mensagem
da liderança era simplesmente "devemos vencer a todo custo”, cabendo às
bases decidir o que fazer e como fazê-lo. E como as eleições locais mostraram,
esta mensagem era interpretada de maneira diferente em cada lugar. Mas a
diferença desta vez foi uma aparente segunda ordem superior, pedindo uma melhor
organização a nível local e “goleada” nas eleições. A Frelimo está a ganhar por
uma grande margem, e a tomada de decisões e acções descentralizadas torna muito
difícil avaliar o contributo da fraude. Ontem, porém, a União Europeia notou
correctamente o "campo de jogo desnivelado" e o "clima de
medo". A nova demonstração de controlo e intimidação, sem dúvida,
desempenhou um papel importante na vitória “esmagadora
EUA questiona integridade das eleições e fala de eleitores
fantasmas em Gaza
“Os observadores
eleitorais da Embaixada dos E.U.A. testemunharam diversas irregularidades e
vulnerabilidades durante o processo de votação e as primeiras fases de
apuramento. Por exemplo, em numerosas mesas de votação em Gaza observaram uma
baixa afluência às urnas até ao meio da tarde, mas as folhas de resultados
afixadas e visíveis até 16 de outubro indicaram perto de 100% de afluência às
urnas – resultados que teriam exigido, nas últimas horas do dia, uma taxa de
processamento de votos de tal celeridade que desafia a credulidade”, disse hoje
em comunicado a embaixada dos Estados Unidos. Em outras palavras, os eleitores
fantasmas votaram. “Os nossos observadores em todo o país notaram a falta de
rigor aplicado ao processo de apuramento a nível distrital, em flagrante
contraste com o processo de votação estruturado e deliberado que foi geralmente
observado nas mesas de votação no dia das eleições. Os observadores dos E.U.A.
relataram consistentemente a ausência de qualquer cadeia de custódia evidente para
os materiais de votação durante a transferência das assembleias de voto para os
centros de apuramento distrital, tornando difícil confirmar a integridade dos
documentos de apuramento dos votos. Os observadores da Embaixada dos E.U.A.
também relataram desorganização e falta de supervisão no processo de
apuramento. Viram sacos não selados com materiais de votação expostos e
aparentemente não controlados, com os funcionários eleitorais a manusearem
materiais de votação sem a presença de representantes dos partidos ou
observadores nacionais independentes. Estes exemplos levantam questões acerca
da integridade destes processos e a sua vulnerabilidade a possíveis actos
fraudulentos”. “Embaixada dos Estados Unidos tem preocupações sérias em relação
a problemas e irregularidades que podem ter impacto na percepção quanto à
integridade do processo eleitoral, começando com as discrepâncias que foram
identificadas entre o recenseamento eleitoral e os resultados do censo em
algumas áreas, em especial nas províncias de Gaza e Zambézia. Vários incidentes
de violência e intimidação graves, incluindo o assassinato de um líder da
sociedade civil no período que antecedeu o dia das eleições, foram preocupantes
e podem ter contribuído para as dúvidas do público sobre um ambiente eleitoral
seguro e justo. A incapacidade de inúmeras organizações de observadores
nacionais, independentes e reputadas, obterem credenciais também suscitou
preocupações de transparência. Além disso, o desembolso tardio do financiamento
da campanha colocou os pequenos partidos políticos em desvantagem
significativa”.
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