Presidente de Moçambique pode ser envolvido no julgamento em Londres
O Credit Suisse ameaça arrolar o Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, no julgamento que opõe o banco de investimento ao Estado africano no Tribunal Superior de Londres no caso das 'dívidas ocultas', que deverá ser julgado no próximo ano.
Num documento submetido ao tribunal, o Credit Suisse admite
adicionar o chefe de Estado ao processo como réu ”para responder pelas
suas irregularidades”.
Os advogados do banco terão solicitado às autoridades
moçambicanas, numa carta de 11 de maio, a confirmação de que o chefe de Estado
não reivindica ou se reunia à imunidade relativamente a este caso, mas até
julho ainda não tinham recebido resposta.
A Procuradoria-Geral de Moçambique iniciou este caso na
justiça britânica para tentar anular a dívida de 622 milhões de dólares (552,6
milhões de euros) da empresa estatal Proindicus ao Credit Suisse e pedir uma
indemnização que cubra todas as perdas resultantes do escândalo das ‘dívidas
ocultas’.
Em causa estão as ‘dívidas ocultas’ do Estado moçambicano de
cerca de 2 mil milhões de dólares (1,8 mil milhões de euros) contraídas entre
2013 e 2014 em forma de crédito junto das filiais britânicas dos bancos de
investimentos Credit Suisse e VTB em nome das empresas estatais moçambicanas
Proindicus, Ematum e MAM.
O negócio acentuou a uma crise financeira pública e levou
Moçambique a entrar em incumprimento no pagamento aos credores internacionais.
No caso de o Credit Suisse ser considerado culpado, o
Presidente Nyusi, justifica o banco na argumentação de defesa atualizada,
depositada no tribunal no início de julho, pode ser suscetível a pagar uma
“indemnização ou contribuição”.
Na base da potencial responsabilidade está, nomeadamente, a
referência a um pagamento de um milhão de dólares feito em 2014 pela Privinvest
a uma empresa estabelecida nos Emirados Árabes Unidos com as referências ‘Nys’,
‘New man’, ‘Nuy’ ou ‘New guy’, que os advogados do banco sugerem que se
trataria de Nyusi, na altura ministro da Defesa, devido à semelhança com o
nome.
Outro indício é o depoimento do libanês Jean Boustani,
negociador da empresa Privinvest, durante um julgamento nos Estados Unidos da
América (EUA) ligado ao caso das ‘dívidas ocultas’, alegando que terá reservado
seis milhões de dólares para financiar a campanha eleitoral do atual Presidente
da República moçambicano.
Boustani, acusado pela Procuradoria federal dos EUA de
conspirações para cometer fraude de transferências, fraude de valores
mobiliários e lavagem de dinheiro, foi considerado inocente.
O Credit Suisse atribui também um “papel substantivo do
Presidente Nyusi na consideração e aprovação das transações Proindicus e
Ematum” e que, tendo assumindo que pagamentos foram feitos a outros membros e
funcionários do Governo, “seriam necessários pagamentos a ele para que as
transações ocorressem”.
Os advogados do banco alegam que, se realmente for provado
que o negócio foi ilícito, como invoca a queixa, “o Presidente Nyusi participou
nela através (pelo menos) por alegada aceitação de suborno e violação dos
deveres da lei moçambicana”, podendo ser “responsável como co-conspirador”.
Na semana passada soube-se que o antigo Presidente da
República Armando Guebuza foi arrolado no processo como pessoa relevante para
ajudar a esclarecer o caso.
Na lista de ‘Terceiros’ [Third Parties] encontram-se o filho
mais velho, Armando Ndambi Guebuza, o antigo diretor dos Serviços de Informação
e Segurança do Estado (SISE) Gregório Leão, o antigo diretor de Inteligência
Económica do SISE António Carlos do Rosário, o antigo ministro das Finanças
moçambicano Manuel Chang e a ex-diretora nacional do Tesouro de Moçambique
Isaltina Lucas.
O tribunal pretende igualmente ouvir Teófilo Nhangumele e
Bruno Langa, duas pessoas próximas de Armando Ndambi Guebuza.
À exceção de Armando Guebuza e de Isaltina Lucas, todas as
personalidades que o Tribunal Superior de Justiça de Londres pretende ouvir
estão detidos em Moçambique acusados de envolvimento no escândalo das ‘dívidas
ocultas’.
Iskandar Safa, proprietário da Privinvest, passou também a
estar referido no processo como assistente.
O julgamento no Tribunal Comercial do Tribunal Superior de
Londres só está previsto começar em 2021.
LUSA – 31.08.2020
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